quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

POÉTICAS DO DIA-DIA. Uma análise estética do universo político-social do MMA.

Por Rodolfo Carvalho

Publicado originalmente no blog Opinião e Ideia.

MMA ou Mix Martial Arts é uma invenção dos seres humanos em fins do século XX e início do XXI. Na época do famoso PRIDE ou como tão cordialmente chamamos aqui no Brasil "Vale Tudo", as lutas eram extremamente violentas e não haviam muitas regras e basicamente a proibição de chutar o saco do adversário era para que a luta durasse mais. Sendo assim, criaram um modelo de combate que misturasse diversos elementos de várias artes marciais num "big mac" de golpes. Foi justamente nessa época que surgia o UFC, que ninguém botou fé e acabou sendo o principal evento de MMA do mundo. Parabéns ao Dana White!


Anderson Silva - Lutador de MMA. Corre o risco de se aposentar por causa de uma séria lesão em uma luta.


Bom, na verdade o MMA nunca me surpreendeu enquanto arte marcial até porque eu não o considero assim. Lembro-me quando conversei com o Sensei Haroldo Daniel, irmão do Kyoshi Dorival Rangel, (ambos discípulos do Hansho Ivo Rangel) acerca da opinião dele (Haroldo) sobre o que ele achava do MMA. Obtive uma das respostas mais sensatas de um praticante veterano de Karatê: "quem é lutador de verdade não sobe ali". Na hora foi uma resposta meio impactante, pois era O EVENTO televisivo e todo mundo gostava. Mas, com o passar do tempo percebi, graças aos treinos com meu sensei e amigo Eliovaldo Carvalho como artes marciais tem muito maior relação com o termo "arte" do que com a prática marcial puramente. Me graduei faixa preta e lecionei por um curto período apenas interrompido pelas obrigações acadêmicas que me deixaram em uma decisão "salomônica" mas inevitável na qual não me arrependo embora sinta profundas saudades do Kodansha Kai. Com meu retorno às artes marciais, por indicação do meu amigo Tuchê, também faixa preta, passei a treinar com o mestre de Muay Thay e amigo Marcos Araújo cujos ensinamento ainda pretendo aproveitar assim que me recuperar totalmente. Bom e para que isso tudo? Eu, particularmente adoro treinar e dedicar mente, corpo e espírito ao treino por uma meta pessoal que não visa o confrontamento por recompensa em campeonatos. Nunca gostei, admito mas respeito meus irmão de faixa que competem bravamente no koto ou no ringue.


O Karatê se desenvolveu na Bahia através dos ensinamentos do mestre Yuchizo Machida.


Uma coisa que eu percebi nesse 20 anos de lutas é que todos os que fizeram parte dessa centelha de minha existência nunca visaram mais do que o auto aperfeiçoamento. Não desmerecendo o mestre Marcos Araújo, exímio lutador de MMA mas com uma graduação de mestre em Muay Thai, Full Contact e Jiu Jitsu. Ainda assim, vejo a batalha diária do mesmo enquanto educador e transformador para manter suas turmas e sua vida de atleta que não é nada fácil mesmo tendo uma forte empresa que patrocine suas atividades mas que não lhe dá nenhuma fortuna.


Tony Jaa - Um dos mais destacados artistas marciais da atualidade, protagonizou o filme Ong Bak.


O MMA me preocupa pois é um sonho que muitas pessoas querem alcançar mas que poucos sabem que não é nenhum sonho ser atleta de MMA. As dificuldades que um atleta chega passar antes do estrelato assim como durante, são absurdas chegando a danificar o seu corpo para que seus empresários possam garantir que as câmeras transmitam o modelo quase espartano de beleza e perfeição. O novo modelo de homem, ou como Galvão tão mediocremente falou: "os gladiadores do terceiro milênio". Por favor, né Galvão! Respeita os gladiadores!


Gichin Funakoshi, fundador do Karatê Shotokan, desenvolveu o sistema de faixas coloridas como metodologia pedagógica inserindo a arte secular nas escolas e universidades no Japão e no exterior.
Jigoro Kano desenvolveu o Judô, uma das artes marciais mais praticadas em todo o mundo e que participa dos jogos olímpicos consagrando o Brasil com diversas medalhas.


Eu continuo não sendo seduzido pelo MMA embora ache interessante explorar a "etimologia" dos golpes em uma luta e encontrar as conexões com outras modalidades, mas nada além disso. Se você quiser saber tudo, pratique individualmente cada uma. Ginchin Funakoshi desenvolveu um projeto pedagógico seríssimo no Japão pós Segunda Guerra com o Karatê e acredito que aprender a arte sem entender esse projeto deixaria o aprendizado com lacunas enormes, assim como Jigoro Kano e seu projeto com o Judô. Vivemos em uma sociedade que preza muito chegar ao pote com muita sede. Isso quase nunca dá certo. Quase sempre o pote derrama.

Rodolfo Carvalho é Artista Visual e Ilustrador. É faixa preta de Karatê e praticante calhorda de Muay Thai.

Nenhum comentário:

Postar um comentário